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sábado, 11 de fevereiro de 2012

CONVITE

20  sentados
38  de pé

O elétrico é como um álbum fotográfico com mil retratos de personagens de Lisboa. Como os reformados ocupando os existentes 20 lugares sentados; os jovens, dobrados pelo sono pesado da mochila às costas, de caminho para a Escola; os pares de enamorados trocando, entre si, adivinháveis promessas ilusórias de amor eterno...
Variada gente, mais triste do que alegre, que se desloca no amarelo como peixe fora de água, sem esconder a apreensão pelo aumento dos passes e de outros custos que se pagam em vida. Por norma, sempre alheios à campainha que o guarda-freio faz retinir, qual piloto ao leme nos dias de nevoeiro no Tejo…
O elétrico com a imagem de um pendura ou de um cacho deles, encavalitado na popa do carro, aos solavancos, por ruas, largos, praças e velhas calçadas… Ou mesmo de uma fadista, trilhando o xaile com os dedos, enquanto canta, durante a maré de Junho que trás aos velhos bairros de Lisboa a sardinha assada, os cravos e os balões de rua.
E outros mais protagonistas viajeiros, como os pickpockets nos 38 lugares de pé:  saqueadores sobre carris, com chapéus de praia, usados em todas as estações do ano, e uma camisola estendida no braço como se estivesse a secar no arame…
Estes mestres do ilusionismo, fazendo evaporar, num ápice, a carteira a um camone. Incautos turistas que lhes apraz viajar à janela de um 28 ou de outra carreira, sem resistirem ao exercício da sua própria rapinagem de trechos da urbe:
uma panorâmica do rio a partir das Portas do Sol; um clichê à fachada da basílica da Estrela; um clique certeiro à pitoresca Graça; um justo disparo ao polémico São Bento…
Esta gente, de fora, mas com a qual me sinto, fotograficamente falando, mais próximo:
sempre que tomo uma paragem de elétrico qualquer como se tratasse de um cais de embarque para rever e fixar as gentes de Lisboa. Com a indispensável câmara!


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